"Tudo está bem como está, segundo me acabou de dizer. No entanto a necessidade de saber mais, a necessidade de me encontrar de verdade subsiste em mim. Deveria eu cessar todas essas buscas? Deveria me conformar àquilo que sou?" Arguiu a Sara.
"Quem é que tem essa necessidade?" Replicou de imediato o Ricardo.
Refletindo na questão, responde de seguida, " É a Sara, e já sei o que vem a seguir. É mais um pensamento que surge em mim. Sim, vejo isso. Mas confesso que é difícil estar constantemente consciente desse mecanismo automático que ocorre. Os pensamentos surgem, não tenho como os controlar."
" Exacto, nem é suposto que os controle. Até porque não há ninguém para os controlar. Os pensamentos surgem e tal como surgem partem. É a atenção que lhes dispensamos que os tornam mais ou menos longos, mais ou menos recorrentes. E no entanto o espaço ilimitado que é continua sendo como é, nada o altera, mesmo que um pensamento surja e diga que tudo mudou, na verdade nada muda, tudo permanece imutável. Apenas as perceções são mutáveis e a experiência das mesmas, o são, quando nos identificamos totalmente com esses pensamentos. Com essa ideia limitada de nós, o ego."
" Eu senti esse espaço, que havia referido, entre pensamentos. Como podemos fazer para que a consciência desse espaço seja maior?"
"Através da prática. Enquanto humanos estamos de tal forma identificados com essa personalidade que cremos ser a nossa, com o ego, que existimos num estado de dormência. Por si só nada tem de errado, faz parte das regras do jogo e no entanto alguns de nós, por diversas circunstâncias da vida, somos chamados a despertar dessa dormência. E isso ocorre por forma a sermos um exemplo para os restantes daquilo que é a essência, para sermos um reflexo do estado natural e real daquilo que somos. Ainda que esse reflexo ainda seja uma limitação, pois enquanto formos humanos, enquanto estivermos nesta dimensão, não poderemos plenamente vivenciar a essência que somos, pois este corpo e mente não podem suportar a plenitude do todo que somos de verdade."
"Falou em despertar, é isso que desejo, despertar de verdade. E nunca mais voltar a este estado de dormência. Quero deixar de sofrer, de ser criticada, de ser rejeitada, de ser abandonada." Dizendo isto com a voz embargada em emoção.
"O que acaba de referir é uma mostra dessa luta que o ego leva a cabo para manter a sua existência, o seu controle. Tudo o que referiu é puro ego, é um reflexo dessa ideia de limitação. Uma ideia de sofrimento, o medo de ser criticada, de ser rejeitada, de ser abandonada. Tudo isso é ilusório. Ou seja, não é aquilo que julga que é. A critica existe, a rejeição existe, o abandono existe... só não existe alguém que seja criticado, que seja rejeitado, que seja abandonado. Tudo isso é uma construção, uma estória recorrente, alimentada em contínuo. Tudo o que referiu são reflexos seus projetados na sua realidade e que servem como sinais que se dá a si mesma para que relembre quem é de verdade. Ninguém lhe pode fazer nada. Apenas a Sara pode fazer o que quer que seja a si mesma. E isso pode ter a forma de alguém na sua vida a representar esse papel criada dentro de si em primeiro lugar."
"Se é assim o que tenho de fazer para superar isso, para deixar de fazer estas coisas a mim mesma?"
"Mais que fazer é deixar de fazer, é fazendo menos que entra em fluxo com a sua essência, com a vida que é. A vida que é é simples e perfeita assim como é. Aceitando aquilo que é passa por estar presente em cada momento e isso não significa que não possa divagar nos seus pensamentos, pois eles continuarão a existir. Mas sim que passa a observar esses pensamentos, deixando de se identificar totalmente com esses pensamentos. Fazendo auto-inquérito, questionando a veracidade desses pensamentos, mas acima de tudo sendo o observador dos mesmos e desse modo entrando em contacto com esse espaço ilimitado que é. E isso levará o tempo que for necessário até que esteja preparada para realizar que não precisa de mais tempo para se relembrar em pleno tudo aquilo que é agora e que nunca deixou de ser. E sim pode existir uma ânsia que tudo ocorra mais rápido, mas levará o tempo que for necessário para que esteja preparada para lidar com isso."
"Existe um tempo mínimo para que isso ocorra?"
" Não existe tempo, pode fazer isso agora, se estiver preparada para isso. O tempo é uma realidade humana precisamente para permitir vivenciar todas as experiências que cada humana vem vivenciar. Quanto estiver verdadeiramente preparada e não é algo que possa decidir por si, se está ou não preparada. O despertar acontecerá como tiver de acontecer e não porque julga que o deseja muito. Estas sessões comigo são parte dessa preparação, não foi por acaso que veio até mim. Isto do seu ponto de vista, pois para mim resulta de igual modo, não é por acaso que veio até mim, também eu tenho algo a aprender consigo sobre quem sou. Somos todos Um em essência"
"Sim acredito no que me diz, sinto que é verdadeiro para mim. Que não foi por acaso que nos conhecemos e que de verdade me tem ajudado bastante a conhecer quem sou de verdade. Tenho hoje já uma perceção muito diferente daquilo que sou e do que posso ou não fazer por mim nesta busca por autoconhecimento."
"Tudo isto que trabalhamos nesta sessão terá o seu percurso normal, fará em si os efeitos que tiver de ter ao longo dos próximos tempos. Procure estar em consciência no momento presente observando o que ocorre, quer dentro, quer fora de si. Aceite os sinais que a vida lhe vai dando, pois ela é você a conversar consigo mesma."
Assim terminou mais uma sessão que seria o início do verdadeiro despertar do torpor de limitação da Sara.
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