sábado, 18 de janeiro de 2014

#50 Reflexo

Sara dava inicio a uma nova sessão com o Ricardo partilhando os seus desejos, aquilo que era a sua vontade, dizendo o seguinte:
"Sabe Ricardo, todo este processo que iniciei de autodescoberta, de conhecer quem sou de verdade e a realidade em que estou inserida. E que tanto me tem ajudado a entender, a evoluir nesse processo. Chegou a um ponto em que me vejo a desejar mais. Aquilo que quero de verdade é despertar. Ter as mesmas experiências que outros já tiveram e que li em livros e vídeos que vi na net, relatos dessas experiências. É isso que eu desejo para mim, despertar de verdade deixar de sofrer, de me preocupar tanto e ser livre de verdade. Sem preocupações, sem limitações. Será que poderei conseguir atingir esse nível, como o dessas pessoas que são iluminadas? Estarei habilitada a tal desiderato? Ou só algumas pessoas é que tem a capacidade de tal?"
Olhando-a nos olhos permanecendo em silêncio, Ricardo fez uma pausa antes de responder.
" É esse desejo de ser mais do que é neste momento que a impede de tomar consciência que já é tudo aquilo que deseja ser e muito mais do que isso. Pois aquilo que é a essência de todos nós não pode ser contido em nenhum conceito. As palavras são insuficientes para o explicar. Essa sensação de falta que a leva a querer ser iluminada, a desejar despertar tem origem numa ideia de si. Acredita ser essa personalidade que se habituou a ser, tal como lhe foi ensinado a ser desde criança. A noção de eu surge por volta dos dois anos de idade. Nessa idade a criança assume a sua personalidade, reconhecesse pelo nome que lhe foi dado, reconhecesse como separada dos outros e que tem de interagir com eles. Ela percebe que o que faz causa efeitos nos outros. E vai cimentando essa ideia de si ao longo dos tempos, tratasse de um conjunto de ideias que se repetem continuamente e que se colam à pele de cada um. Até que exista apenas essa personalidade, que depois se vê como o centro de uma estória e por vezes é líder da sua estória,  outras vezes é vítima dos outros e das circunstâncias. Isto acontece com a Sara, como com qualquer ser humano, depois de acordo com o nível de consciência e a preparação para tal pode-se dar aquilo a que normalmente se chama o despertar. Este despertar não é mais do que relembrar que somos mais que apenas um corpo e a personalidade que lhe está adstrita., que aconteça o que acontecer nesta experiência humana a essência que somos continua sendo perfeita e imutável como é.  No entanto existe muita ilusão relativamente ao despertar, isto porque o ego, que é essa ideia limitada de nós, ele quer manter o controle. O ego não quer deixar de existir e uma das formas que ele encontra para manter o seu jogo, de busca mas não encontres, é também através dessa busca espiritual. Criando uma ideia de objetivo a alcançar um estado de iluminação, de perfeição do ser melhor que todos os outros que ainda não despertaram. Isso é puro ego, que se perpetua reforçando a ideia de separação. Essa ideia de perfeição onde o sofrimento e todos os problemas terminam, onde apenas a alegria esfuziante persiste. Com isso são criadas expectativas sobre o que é o despertar, sobre o que é atingir a iluminação que na verdade nunca serão atingidas. Tal como é o objetivo do ego. Dito isto, quero dizer que o ego não é o inimigo, que ele não é um obstáculo. Só o será se se deixar limitar nessa ideia, o ego é um instrumento, é se quiser um programa que permite funcionar nesta dimensão. No entanto há algo que usa esse programa, algo que é anterior a esse programa, a essa ideia de limitação. Esse algo é quem somos em essência. E podemos a qualquer momento escolher ser quem somos de verdade, a vermos para lá da ilusão que, enquanto humanos, cremos ser a nossa realidade, a nossa natureza. A iluminação só terá utilidade aqui nesta dimensão para os humanos, pois a nossa essência sendo perfeita nada necessita. E ser iluminado enquanto humanos significa aceitar e vivenciar o presente tal como ele é com desapego. Ou seja, este desapego não implica que deixe de se importar com a realidade em que vive, mas sim que sabe que essa realidade não a define, não belisca o que quer que seja a essência. Ficando assim desse modo livre para experienciar tudo o que tiver de experienciar, tal como se apresentar, tal como é, sem desejar que seja outra coisa qualquer de diferente."
"Tudo isso que disse como eu desejo que seja assim para mim.- disse com um suspiro- Como desejo ver desse modo. Será que alguma vez o conseguirei?"
" Sim consegue, porque de verdade já o conseguiu. Não é algo que tenha de alcançar, mas sim, de se permitir reconhecer que assim é. E pode consegui-lo agora se desejar. É uma escolha sua."

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