" Sendo totalmente honesta consigo e comigo. De verdade o que mais temo é não saber lidar com toda esta situação. Mesmo passado todos estes anos, tenho para mim como sendo mais simples evitar lidar de frente com tudo isto e o impacto que tem tido na minha vida. Este medo de perda de controle, de perder a noção de quem sou e do que faço aqui. É esse medo que me impede de ser feliz e de procurar concretizar o desejo de ser mãe." Assim falou Daniela ao Ricardo. Este respondeu dizendo: "Daniela tem a certeza absoluta que não tem lidado com a situação?"
"Tenho, porque é..." Sendo interrompida pelo Ricardo, "responda-me apenas sim ou não. Tem a certeza absoluta que não tem lidado com a situação?"
"Colocada dessa forma, eu diria que não. Não tenho lidado com a situação, que o medo me tem impedido de agir. Que tenho optado por de certa forma fugir da situação."
"Ok, então admitindo que essa sua resposta é a verdade, como se sente acreditando que assim é?"
" Eu sinto-me mal comigo mesma. Sinto vergonha por não ser capaz de lidar com a situação de outra forma. Sinto que deveria fazer algo mais para resolver a situação, contribuir para que a vida fosse mais fácil para a minha família. Sinto que não devia ser tão fraca, sempre com medo de me perder. Que esta necessidade de controle, de tentar direccionar a minha realidade limita a minha vida." Conclui a Daniela com a voz embargada em emoção.
"Por um instante imagine como seria a Daniela sem esses pensamentos, sem essa estória toda?"
Após um momento de silêncio que preencheu o espaço, ela arguiu, "a primeira impressão que me surge é a de liberdade. Sem todos estes pensamentos de medo que me condicionam há tanto tempo, que já nem recordo como era viver sem eles. A sensação que me surge é a de que seria livre. Sinto que se isso fosse possível, um peso imenso seria removido de cima de mim. Julgo que a minha vida seria muito diferente da atual. Poderia enfim construir a família que tanto desejo e que tudo fluiria simplesmente. Seria muito feliz se isso fosse possível de ocorrer."
" O que acha que impede que assim seja?"
" Aquilo que impede que assim seja...de verdade... não sei responder. Não sei o que impede que isso aconteça. A realidade dos factos, ou seja, isto é real. Existe na minha vida."
"Será que é real ou é apenas a sua perceção que o torna real para si? Ou seja, aquilo que eu lhe estou a dizer é que é a sua perceção da realidade que a faz desse modo. Sim existe a doença da sua irmã, nesta dimensão, mas a forma como reagiu a isso depende apenas de si. Essa sensação de falta de liberdade, esse medo de perder o controle e deixar de ser essa personalidade que acredita ser. Tudo isso foi criado por si e não tem comprovativo na sua realidade. São tudo suposições suas, são cenários criados na sua mente. Por um momento apenas observa esses pensamentos que surgem na sua mente, apenas observe sem os julgar."
Assim fez a Daniela, ela fechou os olhos e deixou-se mergulhar nos seus pensamentos, procurou apenas observar, sem julgar. E os pensamentos fluíam na sua mente, sem cessar uns atrás dos outros, numa cadência continua, eles desfilavam e ela apenas os observava. Aquilo que se fez notar foi a paz que sentiu, ela tornou ciente que sem resistência da sua parte, como sempre fez quando surgiam estes pensamentos na sua mente, sem essa resistência aquilo que ela notava era a paz que estava presente.
E de seguida partilhou isso mesmo com o Ricardo, descrevendo isso que sentia e como tudo ganhava uma dimensão diferente do que havia tido até ai. Ainda que não soubesse de que forma era diferente, mas era isso que ela sentia.
A sessão terminou com Ricardo recomendando que se permitisse repetir mais vezes esse exercício, de se permitir estar presente com os pensamentos que surgiam sem os julgar, sem os repelir. Apenas observando.
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